domingo, 13 de abril de 2014

Preconceitos e estereótipos – mulheres em foco.


De carona em fatos recentes (ação de encoxadores, divulgação desastrosa de pesquisa do IPEA), borbulham os preconceitos e estereótipos em relação a nós, mulheres. Sim, eles diminuíram (um tantinho só), mas continuam sendo o sustentáculo da educação de muitas famílias, o exemplo que os pais escolhem e praticam para que seus filhos sigam. Não, isso não é um discurso feminista, é quase uma Ode à liberdade, à expressão “Viva e deixe viver”. É tão trabalhoso assim questionar o que nos ensinam e o nosso próprio discurso? Ou é somente uma forma mais cômoda de viver?
Lidamos com as várias formas de preconceito e estereótipos ligados à realidade feminina:
  • isso não é serviço de mulher – jura que eu não posso trocar pneu?
  • existe mulher pra casar e mulher pra transar – talvez o mais tacanho dos preconceitos.
  • qualquer mulher solteira (leia-se sem namorado), em  sintomas de mau humor, tristeza ou afim, é por falta de homem – esse é de vomitar!
  • a roupa que uma mulher veste faz dela santa ou vagabunda
  • se a mulher é simpática no primeiro encontro, ela está dando trela – certamente quer fazer sexo com o cidadão para o qual ela está sorrindo.
  • não existe amizade entre homem e mulher.
  • mulher tem de ser mãe.

Muitas das estranhas teorias milenares ligadas à mulher passam pela sua sexualidade, pela sua vida íntima. É assim: mulheres, temos aqui X estereótipos. Com certeza você se encaixa perfeitamente em um deles. Caso contrário, você não existe, não é um ser classificado socialmente. Será que os crentes e praticantes dessas teorias (talvez, sim, muitos de nós) lembram-se de que as pessoas, homens ou mulheres, são seres únicos, cada qual com suas preferências, sua personalidade, seus desejos? Que as aparências são aparências e só? Julgar é muito fácil, muito prático.
Questionar: verbo lindo! Questionar é abrir a porta da liberdade de expressão, de pensamento. Por que devemos viver com base em moldes? Por que devemos aceitar que somos um exército de criaturas que pensa e age igualzinho?
Que sempre existam perguntas! Que sempre haja mudança!
Que a minha individualidade feminina não tire o seu sono!

domingo, 6 de abril de 2014

Poesias que ouço – “O Sempre Amor”


Adélia é inspiradora, simples. Nascida em Divinópolis, Minas Gerais, Adélia Prado formou-se em Filosofia e teve o auxílio precioso de Carlos Drummond de Andrade para lançar seu primeiro livro, Bagagem, em 1976. Daí em diante o sucesso foi inevitável.
O Sempre Amor é um CD, gravado em 2001 e 2002, com poesias de Adélia, declamadas por ela. A obra conta com a participação da Orquestra de Câmara do Sesiminas e trilha sonora de Mauro Rodrigues.
Assim que tomei conhecimento da existência de tal CD, minhas anteninhas poéticas ficaram frenéticas. O problema foi achá-lo. Procurei até me cansar, mas não desisti. Dois anos atrás, com o advento da “listinha do bem” (lista de sugestões de presentes de aniversário que fiz para os amigos pararem de reclamar que sou chata e difícil de agradar), sugeri esse CD da Adélia Prado. Não é que ganhei o bendito! Quem tem amigos não morre desejando um presente difícil! E quem tem uma amiga-irmã-alma gêmea ganha o CD “O sempre Amor”! E o meu veio com o amor de Adélia e o amor de Fátima! Amém!
Recomendo: ouçam o CD inteiro. É belo ouvir Adélia!
Como aperitivo, seguem duas das belezas de “O Sempre Amor”:

O Sempre Amor
Amor é a coisa mais alegre
amor é a coisa mais triste
amor é coisa que mais quero.
Por causa dele falo palavras como lanças.
Amor é a coisa mais alegre
amor é a coisa mais triste
amor é coisa que mais quero.
Por causa dele podem entalhar-me,
Sou de pedra sabão.
Alegre ou triste,
amor é coisa que mais quero.


Para o Zé
Eu te amo, homem, hoje como toda vida quis e não sabia, eu que já amava de extremoso amor o peixe, a mala velha, o papel de seda e os riscos de bordado, onde tem o desenho cômico de um peixe — os lábios carnudos como os de uma negra.
Divago, quando o que quero é só dizer te amo.
Teço as curvas, as mistas e as quebradas, industriosa como abelha, alegrinha como florinha amarela, desejando as finuras, violoncelo, violino, menestrel e fazendo o que sei, o ouvido no teu peito pra escutar o que bate. Eu te amo, homem, amo o teu coração, o que é, a carne de que é feito, amo sua matéria, fauna e flora, seu poder de perecer, as aparas de tuas unhas perdidas nas casas que habitamos, os fios de tua barba.
Esmero. Pego tua mão, me afasto, viajo pra ter saudade, me calo, falo em latim pra requintar meu gosto:
"Dize-me, ó amado da minha alma, onde apascentas o teu gado, onde repousas ao meio-dia, para que eu não ande vagueando atrás dos rebanhos de teus companheiros".
Aprendo. Te aprendo, homem. O que a memória ama fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.
Te alinho junto das coisas que falam uma coisa só: Deus é amor. Você me espicaça como o desenho do peixe da guarnição de cozinha, você me guarnece, tira de mim o ar desnudo, me faz bonita de olhar-me, me dá uma tarefa, me emprega, me dá um filho, comida, enche minhas mãos.
Eu te amo, homem, exatamente como amo o que acontece quando escuto oboé. Meu coração vai desdobrando os panos, se alargando aquecido, dando a volta ao mundo, estalando os dedos pra pessoa e bicho.
Amo até a barata, quando descubro que assim te amo, o que não queria dizer amo também, o piolho.
Assim, te amo do modo mais natural, vero-romântico, homem meu, particular homem universal.
Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.
Como grande senhora vou te amar, os alvos linhos, a luz na cabeceira, o abajur de prata; como criada ama, vou te amar, o delicioso amor: com água tépida, toalha seca e sabonete cheiroso, me abaixo e lavo teus pés, o dorso e a planta deles eu beijo.





“Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.” Lindo esse trecho! Curto e poderoso!



Leio, releio, ouço e não me canso!